Time for Miracles

* trilha sonora para a crônica ao fim do texto para quem quiser ler escutando as músicas que me inspiraram

As luzes cintilavam em torno do pinheiro natural de aproximadamente 3m de altura. Luzes brancas, fitas vermelhas, douradas, bolas metálicas, anjos. O Natal na casa dos cunhados não era uma novidade para Bárbara; um Natal de alegrias e encantamento sim era-lhe uma novidade. Pela primeira vez desde a infância apreciava a magia da data; pela primeira vez desde a infância desfrutava de ver crianças correndo em torno da árvore, ansiosas por seus presentes; pela primeira vez desde a infância permitia-se encher de sonhos no Natal.

Ao alcance de seus olhos, seus mais preciosos e inusitados presentes. Encantada como nunca pensou que pudesse ficar, contemplava com carinho e emoção o casal de pequenos em seus respectivos carrinhos. Ele um garotinho perfeito, com grandes olhos azuis como os dela e de seu marido, bochechas rosadas e uma rala penugem loira a cobrir-lhe a cabeça; ela uma princesinha com farto cabelo negro e vivazes olhos castanhos. Ele, o filho do sangue, o fruto da gravidez não planejada, embora fosse casada havia 25 anos; ela, a filha do coração, a surpresa à porta de casa poucos diante de dar à luz o menino. Mas para Bárbara não haveria diferenças. Amava igualmente a ambos e por ambos estava disposta a se sacrificar.

Ainda se surpreendia consigo própria. Nunca desejou filhos embora seu marido sempre houvesse sonhado com uma casa cheia; sempre preveniu-se rigorosamente, apavorava-lhe a ideia de engordar, de não retornar ao seu bom corpo de sempre. Descobrir-se grávida deixou-a em pânico. Como? Por quê?, perguntava-se inconformada. Ainda assim, estranhamente, nunca cogitou o aborto. Não demorou até que a criaturinha que em seu ventre crescia a conquistasse por completo.

Descobriu-se uma pessoa completamente distinta; descobriu uma Bárbara que até então ela própria desconhecida. Já não agia com a futilidade e arrogância que sempre lhe foram tão características. Afeiçoara-se ao marido, a quem sempre fora indiferente exceto para sexo. Sentia o verdadeiro e pleno amor florescer em si. Mais que tudo, sentia-se abençoada por seus bebê. Mais que tudo, Bárbara descobrira enfim sua verdadeira vocação: ser mãe.


Miracles PrintablesTrês abortos espontâneos ao longo da vida; um casamento infeliz. A felicidade plena então chegou de surpresa com o segundo casamento, um marido maravilhoso e os braços enfim ocupados a proteger e embalar uma frágil garotinha. Como temera perdê-la ao longo dos sete meses pelos quais a teve dentro de si; como temera perdê-la naqueles intermináveis 35 dias em que ela esteve na incubadora para ganhar peso e enfim poder ir para casa. Mas ali estava seu pequeno milagre, completando três meses na noite de Natal, em seus braços. Linda, perfeita, saudável. Cecilia sentia-se tomada pela ternura com que desde mocinha sonhara, pela emoção que sempre tivera certeza que significava ser mãe. Enfim, o que por mais de duas décadas havia-lhe parecido impossível, tornara-se realidade. Cecilia enfim sabia o que era ser mãe.


María Elena nunca foi o tipo maternal de mulher. Tinha um casal de filhos: um filho de 19 anos, uma filha de 16, ambos frutos de seu primeiro casamento. A carreira era sua prioridade e a partir do divórcio foi com o pai que eles moraram, não com a mãe, como o habitual. Era muito presente na vida dos filhos, mas apenas nos finais de semana ou férias. Ser uma criminalista reconhecida era-lhe muito mais importante. Casou-se uma segunda vez, não suportava os enteados crianças, divorciou-se outra vez. Com os filhos do terceiro marido não chegou a ter muito contato, já era¨m adultos e viviam sua suas vidas, melhor assim, mas o casamento tampouco durou.

Ainda assim, sonhava com se casar, sonhava com que a quarta vez fosse a definitiva, sonhava com que o para sempre fosse de fato para sempre. O acaso então apresentou-a ao possível número quatro. Ele era um bem sucedido consultor financeiro, divorciado, uma filha da mesma idade que a filha dela. E a relação que começou com atritos logo floresceu em admiração mútua, em amor. O que ela não podia sequer imaginar era que havia muito mais a respeito dele que ela ainda não sabia. E foi também por acaso que descobriu o que ele temia revelar, mas já era tarde demais para voltar atrás. Amava-o e a descoberta apenas fortaleceu o sentimento.

Ela aceitou o desafio, ela encarou a missão; assumiu para si uma das mais difíceis tarefas para mulher: ser mãe dos filhos de outra. Ele era viúvo da segunda esposa; viúvo com dois filhos ainda bem pequenos. Sentada em um dos sofás na sala de estar da residência do primeiro marido e junto dos próprios filhos, acarinhava a pequena e graciosa menininha de quase um ano e meio que estava sentada balbuciante e risonha em seu colo enquanto o garoto de três anos corria atrás da filha mais velha da ex-cunhada de María Elena. Naquela noite de Natal, mais que nunca, María Elena sentia-se maternal. Mais que nunca, María Elena agradecia por essa segunda e inusitada chance de ser uma mãe exemplar. Podiam não ser seus filhos de sangue, mas sabia que eles poderiam para sempre contar com ela como se o fossem, pois era assim que ela os via.


Espero que todos os que acompanham meus textos ao longo do ano tenham tido um excelente Natal!

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