Estaria Rousseau correto a respeito de nascermos todos bons e sermos corrompidos ao longo da vida (discordo veementemente) ou a maldade seria uma espécie de semente que alguns carregam e transmitem geração após geração pelas complexas bases da genética? Menina Má, de William March, não deixa dúvidas quanto a segunda hipótese ser verídica.
Editora: Darkside
Páginas: 261
Onde encontrar: Saraiva
Último livro cuja leitura eu completei ainda em 2016 (comecei em dezembro, mas não concluí “Nada Mais a Perder” e “O Fator Churchill”), Menina Má foi originalmente publicado em 1954 e imediatamente tornou-se um estrondoso sucesso. Com uma temática um tanto polêmica, dadas as inclinações atuais a julgar a infância como uma fase de absoluta inocência, a trama narra os estranhos e trágicos acontecimentos que se dão próximos de Rhoda Penmark, uma adorável garotinha de 8 anos que testemunhou a estranha morte de um coleguinha da escola no piquenique anual da instituição poucos dias após perder para ele um concurso de caligrafia.
à indiferença da menina diante a morte do colega e a sugestão de uma das donas do colégio para que Rhoda seja matriculada em outra instituição são alguns dos gatilhos para que Christine Penmark comece a desconfiar do comportamento de sua única filha e decida investigar sobre crimes e psicopatas. A pesquisa não só leva Christine a desvendar fatos tenebrosos sobre sua filha como também sobre seu próprio passado, do qual já não se recordava.
“Mas vamos supor que ela o tenha seguido até a ponta do cais, e Claude, em vez de deixá-la pegar a medalha, a tenha atirado no mar. Vamos supor que ela tenha pego um galho ou algo assim e batido nele, fazendo-o cair na água, atordoando-o e deixando-o para morrer. Vamos supor…”
Embora o livro seja bastante focado nas preocupações de Christine e nos atos de Rhoda, a história conta com ao menos mais três personagens memoráveis. A inquieta Monica Breedlove, vizinha dos Penmark, dona de metade da cidade e que se gaba de ter sido paciente de Freud, além de obcecada por falar de sexo; o ressentido e pervertido Leroy, zelador do condomínio em que vivem os Penmark com o qual é impossível não se enojar; e, por fim, a controladora e perturbada Sra. Daigle, mãe do garoto que morre no passeio da escola. Todos personagens interessantes, muitas vezes repulsivos, porém todo o tempo extremamente bem construídos do ponto de vista psicológico (e psquiátrico).
O enredo, habilmente construído por March, é um prato cheio para os que apreciamos observar o comportamento humano como um todo, mas principalmente para os que se interessam por entender um pouco de como funcionam e se apresentam ao mundo mentes amorais e/ou psicopatas. Conforme a excelente introdução de Elaine Showalter (1997) presente na edição de 2016 da editora Darkside, Menina Má, assim como outras obras do autor, reflete muitas das obsessões, traumas e fantasias de March, como a presença de mulheres monstruosas e sempre mais perversas que quaisquer personagens masculinos e da ideia de que a propensão ao mal seria transmitida pela linhagem feminina, excentricidades sexuais, caligrafia e crimes bárbaros.
Além disso, é pertinente destacar que, como a maioria dos livros da Darkside, Menina Má é um livro em capa dura com capa e contra-capa incrivelmente belos e assustadores, como podem ver nas fotos no post, o que combina perfeitamente com a narrativa em questão. Além disso, o livro conta com um marcador de página embutido, uma fita de cetim na cor azul turquesa, como os olhos da boneca da capa.
Assim sendo, Menina Má é um excelente thriller psicológico, no qual virar as páginas é um ato automático e compulsivo desde o comecinho da história, que a todo momento surpreende e até mesmo choca, tão repulsivos os comportamentos de algumas personagens. Mais que isso, embora nas últimas páginas do livro seja possível prever o desfecho, este não deixa de ser surpreendente pela intensidade como os fatos desenrolam-se e pela enorme perturbação que acomete Christine após tomar ciência de certos acontecimentos. Cabe ressaltar ainda que o livro teve versões na Broadway e cinematográfica (1956), a qual rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz à então menina Patty McComarck, que interpretou Rhoda Penmark. Menina Má foi o último livro publicado por William March e, sem dúvidas, é um 10/10.
Thaís Gualberto
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Economista & Escritora. Apaixonada por ficção, música, política e coisas fofas. Aqui vocês terão resenhas e, principalmente, textos ficcionais escritos por esta que vos “fala”.
AMO esse livro da DarkSide <3.
Aprendi muita coisa com a pequena Rhoda, mas também sentir um pouquinho de raiva dela hahahaha.
História que prende você de verdade!
Adorei a tua resenha e o seu blog é LINDOOOO DEMAIS.
♥
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