Esperança

Esperança

Cinco vezes vivera aquela experiência, cinco dias que sua memória jamais apagaria. Pranto, dor, tristeza, vazio, perda. Das sete vezes que teve a graça de saber ter recebido em seu ventre o sopro da vida, cinco terminaram sem que tivesse os filhos em seus braços.

Ainda que às vezes fosse às lágrimas ao pensar neles, era feliz por ter descoberto e celebrado aquelas vidas. Amou-os, desejou intensamente que crescessem junto do casal de irmãos nascidos, rezou e sempre rezaria por eles. José. Ana. Ester. Raquel. Paulo. Assim se referia aos cinco em suas orações.

Não era fácil e, mesmo décadas após o último aborto espontâneo, Alma ainda se flagrava ocasionalmente pensando sobre como seria a vida com mais aqueles filhos por perto. Quantos netos a mais, quantas alegrias, quantos desafios, quantas tristezas. E se, e se, e se…! Tantas possibilidades, tantas hipóteses! Sempre que neles pensava, rezava. Não havia resposta teológica precisa sobre o destino daquelas almas que lhe foram confiadas, contudo, cria ardentemente na misericórdia divina, especialmente em relação às crianças.

Desespero, contudo, nunca a havia acometido, nem mesmo nos momentos de maior dor física ou da perda recém-consumada. Chegara sim a discutir com Deus, a lhe expor como não entendia porque aquilo lhe havia ocorrido tantas vezes e como não entender as razões Dele entristeciam-na e perturbavam-na. Ainda assim, ela cria. Vivia os sacramentos, orava e tinha suas esperanças voltadas para o céu!

Lembrava-se vividamente do dia em que tivera a derradeira perda e seu esposo, sempre muito mais calmo e ponderado em seus atos e palavras que ela, buscou consolá-la. Estamos cumprindo o que Deus pede aos casados, estamos povoando o Reino dos Céus… Lembrava-se de ter esboçado um discreto sorriso e sentido o coração ligeiramente mais leve, abraçando o marido fortemente em seguida. O que seria dela sem a firme serenidade de Emiliano diante das tempestades da vida?

Os anos, naturalmente, abrandaram a tristeza e mesmo Alma era capaz de sorrir ao mencionar os filhos que “já estariam junto de Deus”. Também nisso estava a vontade Dele e, consequentemente, a graça. E, assim, dia após dia, antes de dormir, ajoelhavam-se em frente ao pequeno oratório que mantinham no quarto e rezavam sem jamais se esquecerem daquelas cinco almas.

_ Que nossos filhos não nascidos façam com que busquemos o céu com mais determinação… – repetia em oração junto de seu esposo, dia após dia, desde a primeira perda.

_ …para que um dia estejamos todos juntos diante de Nosso Senhor – completava Emiliano, apertando com carinhosa firmeza a mão esquerda da esposa.

A firme esperança de que um dia poderiam estar unidos na glória bastava àqueles pais para que sorrissem apesar daquelas tão prematuras partidas. E essa esperança também os unira ainda mais como casal, e como família, ao casal de filhos vivos e netos com os quais esses os presentearam.

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