*soundtrack ao fim do post
Ele havia errado. Ele sabia muito bem que havia errado veementemente. E se arrependia profundamente. Ele a amava, ele a amava mais que tudo. Como pôde agir de maneira tão cruel, tão desesperada? Sim, o desespero… Era o desespero o culpado por tudo; não o deixara raciocinar, fizera-o se acovardar.
Vinte anos. Por vinte anos ele silenciou. Mentiu, omitiu, calou, sofreu. Um sofrimento solitário, o pior sofrimento de toda a sua vida. Que agonia! O simples pensar nela o perturbava, pois tamanho era o amor que ainda nutria por ela que doía. Doía forte, apertava o peito. E agora que ela estava de volta, sabia bem que ela era sua única salvação.
Mas como fazer com que ela o ouvisse? Não havia perdão, não deveria haver perdão. Mas ainda assim ele devia isso a si próprio. Ele tinha de fazer com que ela o escutasse, ele precisava fazer com que ela ao menos o escutasse. Arrepedia-se profundamente e não ficaria em paz enquanto ela não reconhecesse isso. Na verdade, não ficaria em paz se não voltasse a tê-la ao seu lado, de onde ele jamais deveria tê-la afastado. Mas tudo fora tão confuso na época… O julgamento, a condenação, as crianças, os amigos dele, os negócios da família, Victoria, o desespero… Victoria… Victoria era tudo em que conseguia pensar com clareza, com nervosa clareza.
Ficaria de joelhos por ela, clamaria perdão a ela, contanto que não tivesse de suportar mais um dia sequer ao lado dela. Victoria era tudo o que enxergava ao fechar os olhos, Victoria era tudo o que queria ter diante os olhos ao despertar. Era, contudo, esperar demasiada compreensão, demasiada bondade, demasiada superioridade de Victoria… Vinte anos e muitas cartas de arrependimento escritas, porém nenhuma enviada. Como pôde ter traído os próprios princípios, como pôde ter traído a confiança de quem mais amava? Rogava a Deus que Victoria o perdoasse, mas eram sinceramente ínfimas as suas esperanças.
Aqueles milhares dias longe dela o envelheceram amargamente em espírito, aqueles milhares de dias longe dela o fizeram mais frio, quase anestesiado. Sabia que o sofrimento dela fora muito maior que o seu próprio, no entanto não tinha dúvidas de que seu sofrimento era mais pertubador e matava aos poucos, pois era culpa o que o açoitava noite e dia, todos os dias. Em seu pensamento, em seus sonhos, Victoria continuava única, intocável, inabalável. E a cada dia doía mais, a cada dia dilacerava mais. Se nem mesmo pelo ínfimo e maldito instante em que de fato a considerou culpada de ato tão vil foi capaz de repudiar o amor que por ela nutria, muito menos nos dias, meses e semanas subsequentes, nos quais reagiu e racionalizou que não, ela não teria jamais feito aquilo, que não ela jamais mentiria sobre a própria inocência, ela jamais mentiria sobre qualquer coisa.
Poderia ele aguentar mais um dia de solidão com ela outra vez tão perto? Duvidava. Ele nunca havia pedido perdão, mas era chegado o inadiável momento. Seria tarde demais? Não saberia se não tentasse. Uma das poucas certezas era que havia errado, sim, havia errado, não negaria em nenhum momento. Também sabia que sem ela não pderia viver. Mas precisava com urgência saber, se, apesar de tudo, também ela estaria ansiando por ele. Precisava com urgência saber, se, apesar de tudo estaria disposta a salvá-lo. Salvá-lo do arrependimento, dos sucessivos erros, da culpa; salvá-lo de si próprio.
Thaís Gualberto
0
Economista & Escritora. Apaixonada por ficção, música, política e coisas fofas. Aqui vocês terão resenhas e, principalmente, textos ficcionais escritos por esta que vos “fala”.
Que texto arrebatador!!! Uau, mergulhei na história e em todo instante eu torci pelo reencontro e almejei com veemência que ela o pudesse perdoar. Parece tão real que eu suspirei em cada paragrafo. Parabéns, amei seu jeito de escrever, parece muito comigo, por isso me identifiquei! Vou ler outros textos!!!
Obrigada, Vane! *-* Fico feliz de que tenha gostado! E a intenção era exatamente essa, fazer torcer por ele hehe
Beijos! <3
Thais amo seus textos e quando você sugere uma trilha dessas eu amo ainda mais! hahaha! Fiquei presa na história e me emocionei, já imaginei toda a cena e cinematografia !
Beijos!! Blog Amanda Hillerman
Obrigada, Amanda! *-* Essa é outra das intenções sempre presente nos meus textos: que o leitor seja capaz de visualizar aquilo que imaginei, então fico muito feliz que tenha conseguido visualizar 🙂
Beijos!
Thaís, esse texto é um desses que me faz ir aumentando a velocidade da leitura, falando “correndo” mesmo, como se fosse faltando fôlego à personagem… Acho que conviver com uma culpa tão grande deve ser assim, um bombardeio sufocante de pensamentos, de questionamentos.
Yellow Ever Shine
Confesso que eu o escrevi com essa mesma sensação, com os dedos correndo com violência pelo teclado… Acredito que ele é um dos personagens mais atormentados que escrevo, nenhum outro sente tanta culpa…
Beijos!
Fiquei ainda mais curiosa para saber sobre tanta culpa…!!