Oh Mother

Com sua mãe ela jamais pôde contar. Rosa era fria. Rosa era fútil. Rosa era egoísta. Rosa era insuportável. Rosa era uma vadia. Cobiçara o marido da irmã. Aproveitara-se da ausência da irmã. Provocara o cunhado à exaustão. Mediante vis artimanhas, enredara o cunhado, entregara-se ao cunhado. Então concebeu a filha única. Fruto da inveja, fruto do desespero. Filha da vingança, filha da dor. Mas Rosa nunca amou a filha única. Quatro dias, apenas quatro dias e enfadada entregou o bebê ao pai. E nunca foi de aproximar-se mais do que em aniversários, Natais e formaturas. Ou quando queria tentar alguma reaproximação com o ex-amante. Até por volta dos dez anos chamava-a de mãe, porém com a maturidade veio o entendimento. Passou a ignorá-la, passou a desprezá-la. Apenas agia reciprocamente às atitudes daquela que apenas a concebera e nada mais. Assim cresceu Mariana: distante da mãe, extremamente apegada ao pai, muito agradecida a uma das tias avós. Tinha 17 anos quando Rosa morreu. Nenhuma lágrima verteu, nenhuma tristeza expressou. Apenas se irritou; não teria nunca a oportunidade de confrontar aquela que nunca exerceu o papel que lhe cabia na vida da garota. Apenas sentiu alívio; enfim aquela mulher estava definitvamente fora da vida dela.


Nas primeiras décadas de sua vida, tudo o que Cristina mais desejava era a aprovação da mãe. No final da adolescência, contudo, foi inevitável o confronto. Cristina queria estudar Economia, sonhava com um dia ser uma grande e reconhecida executiva. Mas ela era bonita demais e sua mãe duvidava de que, embora tão inteligente como bonita, ela fosse conseguir um lugar ao sol em um ambiente ainda tão masculino. Cristina contudo não se permitiu abalar, ainda que não tenham sido poucos os momentos em que sozinha e em silêncio chorara. Degrau a degrau conquistou tudo aquilo a que se propusera e isso sem jamais ter abdicado de sua feminilidade e beleza ou mesmo colocado-as em segundo plano.

Isso tudo fez com que se sentisse profundamente decepcionada consigo própria quando sua filha revelou ter em relação a ela o mesmo temor que outrora ela sentira pela própria mãe. Como pude permitir que isso acontecesse?, perguntava-se com tristeza. Não se reconhecia agindo como agira sua mãe quase trinta anos antes, porém, para sua filha era como se assim fosse silenciosamente. Sua filha queria alegrá-la, queria fazê-la se orgulhar por ela. E por isso tinha vergonha de admitir que Economia não era a maior de suas paixões, mas sim o desenho, a moda. Por outro lado, Cristina estava feliz. Feliz porque a filha sabia bem o que queria, feliz porque a filha por fim tomou a iniciativa de lhe dizer o que queria. Ainda assim, lamentava. E lamentava porque os filhos cresciam demasiado rápido, porque a filha já era uma mulher e o filho um homem preste a se casar com a namorada de longa data. Ah, como às vezes gostaria de poder voltar no tempo, mais precisamente ao tempo em que aqueles dois ainda cabiam em seus braços e eram dela tão dependentes e a ela tão apegados. Mais que todas suas conquistas profissionais, era a maternidade que preenchia a vida de Cristina e essa nostalgia antecipada apenas lhe confirmava isso.


Feliz dia das mães a todas as minhas amigas e leitoras que são mães, às mães de meus amigos e dos meus leitores mas, em especial, um feliz dia das mães para a mulher mais importante da minha vida e a quem mais devo ser quem hoje sou. <3

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10 thoughts on “Oh Mother

  1. Bruna says:

    Acho que a arte de ser mãe é só concebida na hora de receber um filho. Mas como qualquer arte, não são todos os seres humanos que estão aptos a fazerem coisas boas e gratificantes… cada mãe é mãe, não importa como seja. Gostei do que você tentou expor com o seu post, muito bacana… adorei a playlist!
    Beijão

  2. Bianca Carvalho says:

    Adoro que você coloca playlist junto com os posts! kjashdakjshd
    Não deve ser fácil ser mãe, e eu acho que todo mundo acaba criando os filhos um pouco do jeito que foi criado, mesmo nas partes chatas. Eu pelo menos imagino que seria uma mãe exatamente como a minha, até com os mesmos defeitos.
    Acho meio bizarro a ideia de que alguém se sente aliviado pela morte da mãe apenas porque ela não a amou. Sei lá. Tenho certeza que isso é real e tem gente por aí que passa isso, e é legal ver isso retratado num texto sobre mães, porque é fora da caixinha.
    Textos fortes e muito bem escritos, como sempre. 🙂

  3. Beatriz Aguiar says:

    Rosa, me deu uma raiva de você no início do texto. Mas no decorrer dele, não adianta, mãe é mãe. Com erros e acertos.
    Mas graças ao bom Deus a minha foi perfeita a vida toda, o único erro dela foi ter partido cedo demais. 🙁 mas isso independe da gente e do nosso entendimento.
    Simplesmente amei teu texto do dia das mães.

    P.s: esses nomes e essa trama me remeteu a algo bem mexicano!
    acertei!? HAHAH

    Um beijo!
    Saudades dessa blogosfera!

    • Thaís Gualberto says:

      Rosa é uma personagem planejada para causar raiva: tanto nos personagens ao redor dela como também nos leitores. E obrigada, Bia! Estava com saudades de suas passagens por aqui. Recomendo a crônica Save Me (final de março), que acho que você não leu rs

      E sim, meus livros se passam no México, mas histórias são mais bem contadas que as novelas de lá hehe

      Beijos

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